Imaginemos a seguinte situação: Os pais de João e Joana faleceram. João morava com os pais. Joana, por outro lado, já morava em outro local. Joana e João, por algum motivo, não realizam o inventário do imóvel.
Diante desse contexto, é possível que João realize a usucapião do imóvel, passando a ser o único proprietário?
Bem, primeiramente, é importante compreender que a usucapião, nada mais é, do que o direito de uma pessoa de se tornar proprietária de um imóvel, mediante o decurso do tempo.
Além disso, ressalta-se que a usucapião não deve ser utilizada como meio de “burlar” a legislação, visto que, no caso narrado acima, o procedimento adequado para transferência da propriedade é o inventário, com a consequente partilha entre os herdeiros.
Pois bem. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é possível que um herdeiro realize a usucapião do imóvel deixado pelo falecido, bastando que cumpra os requisitos expostos na legislação. Vejamos:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSO CIVIL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. HERANÇA. BEM IMÓVEL QUE COMPÕE O ESPÓLIO. POSSE DE UM DOS HERDERIOS. POSSIBILIDADE. LEGITIMITIDADE E INTERESSE DE AGIR.
1. Possibilidade da usucapião de imóvel objeto de herança pelo herdeiro que tem sua posse exclusiva, ou seja, há legitimidade e interesse do condômino usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião extraordinária 2. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.840.023/MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 10/5/2021, DJe de 13/5/2021.)
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. HERDEIRA. IMÓVEL OBJETO DE HERANÇA. POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO POR CONDÔMINO SE HOUVER POSSE EXCLUSIVA. [...]
2. O propósito recursal é definir acerca da possibilidade de usucapião de imóvel objeto de herança, ocupado exclusivamente por um dos herdeiros. [...]
6. O condômino tem legitimidade para usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo determinado em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários.
7. Sob essa ótica, tem-se, assim, que é possível à recorrente pleitear a declaração da prescrição aquisitiva em desfavor de seu irmão - o outro herdeiro/condômino -, desde que, obviamente, observados os requisitos para a configuração da usucapião extraordinária, previstos no art. 1.238 do CC/02, quais sejam, lapso temporal de 15 (quinze) anos cumulado com a posse exclusiva, ininterrupta e sem oposição do bem. [...] (REsp n. 1.631.859/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 22/5/2018, DJe de 29/5/2018.)
Os requisitos são, basicamente:
- Exercício da posse por 15 anos, de forma contínua e sem interrupção. O prazo poderá ser reduzido para 10 anos caso o imóvel seja utilizado para moradia ou tenha sido realizado obras para melhoria.
- A posse tem que ser exercida como ânimo de dono. Isto é, o herdeiro tem que cuidar do imóvel como se dono fosse.
- Posse mansa e pacífica, ou seja, sem qualquer oposição de alguma pessoa.
Cumprido os requisitos, é possível que o herdeiro solicite a usucapião do imóvel.
Certo! Mas o que Joana poderá fazer para evitar essa possibilidade de João solicitar a usucapião do imóvel?
Bem, conforme já referido, o correto será realizar o inventário dos bens deixados pelos falecidos.
Contudo, para precaver qualquer possibilidade de usucapião é preciso impedir que a posse seja exercida de modo manso, pacífico e sem oposição. Para isso, é possível que seja realizado um contrato entre os herdeiros, no qual haverá a autorização para permanência no imóvel.
Esse contrato poderá ser oneroso, ou seja, o herdeiro que permanecer no imóvel deverá pagar aluguel aos demais. Do contrário, deverá ser realizado um contrato gratuito, como o comodato, o qual haverá uma autorização para o herdeiro permanecer no imóvel, sem qualquer cobrança de valores.
Frisa-se, por fim, que existem inúmeras possibilidades de resolver essa questão, devendo o caso concreto ser analisado por um profissional qualificado, a fim de escolher qual o melhor caminho a ser seguido.
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