Primeiramente, precisamos compreender que quando se realiza a compra e venda de um imóvel, não basta apenas realizar a escritura pública de compra e venda, é necessário levar essa escritura ao Cartório de Registro de Imóveis competente, a fim de que seja realizado o registro da compra na matrícula do imóvel, com a consequente transferência da propriedade.
É exatamente isso que a lei determina:
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.
§ 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.
Além disso, a legislação brasileira dispõe que é responsabilidade do comprador realizar o registro da aquisição do imóvel, bem como de arcar com os emolumentos advindos do registro, podendo as partes ajustarem de modo diverso. Vejamos:
Art. 490. Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da tradição.
Desse modo, enquanto a escritura pública não é levada ao Registro de Imóveis a propriedade permanece em nome do vendedor e, consequentemente, as responsabilidades do imóvel também.
Existem inúmeros processos judiciais em que o vendedor acaba por ser responsabilizado pelas dívidas do imóvel, mesmo já tendo realizado a venda anteriormente, haja vista não ter sido transferida a propriedade ao comprador.
Vamos ver alguns exemplos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. LEGITIMIDADE PASSIVA DO PROPRIETÁRIO REGISTRAL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DE REGISTRO DO ATO TRANSLATIVO DA PROPRIEDADE. 1. Segundo o art. 34 do CTN, o contribuinte do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular de seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título, em face dos quais o exequente poderá exigir a satisfação de seu crédito. À autoridade administrativa incumbe optar por um ou por outro com vistas à arrecadação do tributo. Entendimento firmado no Recurso Repetitivo nº 1110551/SP, submetido ao regime dos recursos repetitivos (art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973) no STJ. 2. A existência de instrumento particular de promessa de compra e venda não exclui a responsabilidade do proprietário/promitente vendedor pelo pagamento do tributo. Caso em que não há prova da existência do registro do ato translativo da propriedade no Registro Imobiliário, de modo que persiste a responsabilidade tributária da parte agravante. [...] RECURSO DESPROVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento, Nº 53013521920238217000, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em: 14-12-2023)
APELAÇÃO CÍVEL. CONDOMÍNIO. AÇÃO DE COBRANÇA DE COTA CONDOMINIAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. REGISTRO DO CONTRATO NA MATRÍCULA E IMISSÃO NA POSSE APÓS O PERÍODO COBRADO. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA MATERIAL. TEMA 886 DO STJ. SENTENÇA REFORMADA. NATUREZA CONCURSAL DO DÉBITO. TEMA 1051 DO STJ. 1. A cota condominial decorre de obrigação propter rem, sendo dever do condômino o seu adimplemento, sob pena de multa e demais encargos. 2. O STJ firmou entendimento no julgamento do Recurso Especial n.º 1.345.331/RS (Tema 886), conforme o qual, havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto. Se ficar comprovado: (i) que o promissário comprador foi imitido na posse; e (ii) que o condomínio teve ciência inequívoca da transação, afasta-se a legitimidade passiva do promitente vendedor para responder por despesas condominiais relativas a período em que a posse foi exercida pelo promissário comprador. 3. O que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador e pela ciência inequívoca do condomínio acerca da transação. Caso dos autos em que as cotas condominiais em discussão venceram antes de ocorrida a imissão na posse dos bens pelos promitentes-compradores. Sentença reformada. [...] DERAM PROVIMENTO AOS APELOS. (Apelação Cível, Nº 50158237920198210008, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Pedro Cavalli Junior, Julgado em: 27-11-2023)
Ou seja, é possível verificar que caso a escritura pública de compra e venda não seja levada a registro no Cartório de Registro de Imóveis, o vendedor poderá ser responsabilizado por eventual dívida do imóvel, ainda que o comprador já esteja na posse do imóvel.
Nesse contexto, caso se verifique que a transferência da propriedade ainda não foi realizada, o vendedor poderá enviar uma notificação extrajudicial ao comprador, concedendo prazo para que ele realize a transferência e, caso não cumpra, recorrer à via judicial.
Alternativamente, o vendedor poderá efetuar o registro da escritura pública de compra e venda junto ao Cartório de Registro de Imóveis e cobrar do comprador o valor gasto com os emolumentos.
Certo! Mas e para evitar essa situação, o que pode ser feito?
Uma das alternativas é formalizar um contrato entre o vendedor e o comprador, estipulando de maneira clara:
1. O valor do negócio;
2. Como será realizado o pagamento;
3. Em que momento ocorrerá a imissão da posse;
4. Quem irá arcar com os custos referentes aos emolumentos cartorários; e, principalmente,
5. Qual o prazo para o registro da compra e venda na matrícula do imóvel e, caso não seja realizado, quais serão as penalidades.
Por fim, importante se certificar que a alteração de proprietário do imóvel foi efetuada junto à Prefeitura, bem como às concessionárias de energia elétrica, água e etc.
Ficou com alguma dúvida? Entre em contato!
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